terça-feira, 11 de dezembro de 2012

matutinus


Exausto me deito. Na velha e costumeira tradição das mãos sob a cabeça e sem pés para fora do cobertor. Um leve aperto no peito incomoda o descanso e me viro para o canto. A terrível sensação de não estar só é perturbadora e a certeza quando algo me toca é amedrontador. Um assobio chama dentro de mim até o mais velho e esquecido trauma de uma enterrada infância, um ronco estrondoso paira sobre o ar e de madrugada ao acaso um menino chora. Chora como uma corneta, como quem me avisa o que há por vir. E na janela o medo me observa e espera. Os balbucios tomam o silêncio do meu quarto e fazem da quieta madrugada um show de horrores. Tantas vozes, tantos sons, incompreensíveis apelos dos que deixei por aí, dos que esqueci por aí. Tenebrosos passados que ousam fazer-se presente. São gritos desesperados de vozes que nunca ouvi, de vozes que nunca quis ouvir. A fria madrugada esquenta o medo que sinto. A fria madrugada queima a última coragem que restou em mim e eu fujo. Fujo de passos que me cercam e me encurralam entre as paredes desse labirinto que minha casa se tornou. Cansado eu desisto e no chão me refugio. Meus ouvidos lutam contra os sons que me rodeiam e me prendem as pálpebras que por medo se fecham e por haver desistido não se abrem mais.